sexta-feira, 27 de novembro de 2009

27/11/09                 Uma Coragem Diferente


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    Muitas pessoas vêm a este bosque, buscando a paz e a sombra de um carvalho centenário para contar suas histórias. Desta vez sou eu, o velho carvalho, quem espera as pessoas sentarem-se à beira de minha paz para contar-lhes uma fábula deste bosque, presenciada por mim mesmo com muito encantamento, embora me faltassem os olhos.

    Foi num desses dias em que a chuva das nuvens escuras convive com os raios de sol de uma parcela ainda azul do céu. Avistei Tasso, um cão jovem e dono de muitas virtudes, que porém não havia crescido muito. O pequeno cachorro vinha de longe, caminhando em meio às árvores, buscando o córrego para beber um pouco de água. Quando esse cão apareceu no bosque pela primeira vez, procurou a mim para instruí-lo sobre o caminho das águas. Desde então, habituou-se a passar por aqui vez ou outra para me visitar e pedir por conselhos. Fico contente por ter sempre alguma palavra para ele. Algo qualquer de sabedoria que possuam os carvalhos certamente foi adquirido pelo longo tempo que passam no silêncio.

    E o que rompeu o silêncio daquela tarde foi uma coelhada que corria apressada. O estardalhaço dos coelhos foi seguido por ligeiros tremores no chão, dos quais ainda se lembram as minhas raízes. Pressenti ser um gigante que se aproximava, o que Tasso pôde confirmar ao ver a enorme silhueta vindo a passos rápidos. O pequeno cão sentiu um arrepio ao pensar que aquela poderia ser a sua última caminhada neste planeta. O Gigante avançava, com sua aparência monstruosa e seus gestos grosseiros, pisando arbustos e grunhindo sons. Minha intuição não me dizia coisas boas.

    Às vezes a falta de noção e a coragem se confundem. Tasso não procurou se esconder, embora grande fosse o seu medo, pois maior ainda que o temor era a sua revolta: por que os fracos precisam ser humilhados pelos fortes? Sentia um grande ódio pelas injustiças.  Não apenas a injustiça do Gigante contra o cão - aquilo que dizia respeito a ele próprio -, mas todas as formas de opressão que, imaginava ele, também deveriam existir muito além daquele bosque. Vencendo a hesitação, firmou as patas contra o solo e latiu.

    O pequeno olhava para os olhos imensos que ainda não o enxergavam e latia no limite de suas forças; fazia saltar as veias do pescoço num latido desajeitado, estridente, mas nimbado de idealismo. O Gigante, então, parou por um instante e baixou o olhar na direção de Tasso. Eu senti como se murchassem todas as minhas folhas; pensei estar prestes a presenciar o fim daquele cão tão amado. "Antes talvez nem passasse pela cabeça desse gigante lhe fazer mal", cogitei. Talvez o imenso homem nem sequer o notasse ali; agora, porém, o minúsculo cão o ofendera...

   E Tasso continuava a enfrentar o gigante. Quisera eu que o cãozinho se calasse e fosse embora dali, evitando uma desgraça. No entanto, o Gigante personificava toda a iniqüidade e os problemas do mundo para o jovem cão naquele momento. Combatia-o, portanto, com toda a agressividade do seu heroísmo atrevido, embora a insignificância do seu tamanho, como se de uma hora para outra pudesse adquirir poderes milagrosos e derrotá-lo.

   O Gigante admirou-se do insulto, proferido por um cãozinho que estava vendo pela primeira vez. Engoliu um pouco de saliva, esforçando-se para conter a indignação que sentia. Que fizera para merecer aquela agressão, de um desconhecido que poderia desaparecer com uma mera pisada sua? Olhou ainda uma vez para Tasso. Encheu os pulmões de ar para em seguida dar um supiro, e continuou sua caminhada, indiferente aos latidos.

   A garganta do cão foi perdendo a energia. Não sei o que se passou em sua cabeça naquele momento. Sei que, dali em diante, passei a amar também aquele gigante humilde que um dia andou por aqui.

Raul França

(Créditos das imagens:
http://www.fotodependente.com/postcard.img8883.htm?mode=search
http://cadacontoaumentaumponto.com.br/)

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

06/11/09            Me contaram um dia desses

    São Pedro, ambientalista que é, ficou sabendo pelo Twitter de uma nova campanha criada pela WWF e resolveu desligar a camada de ozônio essa semana para economizar energia.
   
    Aqui embaixo, torra-torra. Não, não é uma promoção das Casas Bahia (quem dera!), mas um calor danado mesmo.  Nos elevadores da cidade não se fala de outra coisa (literalmente).