quinta-feira, 7 de junho de 2012

Pequenos Projetos de Ser

Queria que fosse mais fácil, tem horas.
Ah - quem não queria?
Que tivesse resposta pra tudo, em um manual.
E que bastasse ler pra sair fazendo tudo certo.

Não encontrando esse bendito volume na estante - que haveria de ser uma enciclopédia das mais grossas -, toco meus pequenos projetos de ser.

A cada dia, uma pequena novidade a ser testada no campo do comportamento.

E assim, despretensiosamente, a gente vai se remendando.

sábado, 15 de janeiro de 2011

16/01/11                         Se expressar
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    E, largando o papel e a caneta, decidiu que não escreveria mais um texto. Não se esforçaria para traduzir em frases articuladas aquelas idéias tão particulares, que faziam sentido tão só para quem havia vivido o contexto do começo ao fim. "Pessoas", pensou, "pessoas não aprendem nada através de raciocínios e teorias; no máximo, adquirem informações novas. Cada pessoa que se desloca sobre a Terra tem um universo próprio de questões, e não tem nenhum motivo para interessar-se por idéias distantes, cujo sentido não compreendem. Aprender tem a ver com a alma".

Ainda assim, queria se expressar de alguma forma. Experiências novas palpitavam no seu espírito, de uma forma tal que não conseguiria trancafiar tudo aquilo dentro de si. Sua compreensão havia se dilatado, graças àqueles novos pensamentos; tornou-se capaz de atribuir novo significado às coisas. No entanto, ciente de que, por mais eloquentes que fossem, suas palavras não estavam aptas para traduzir sentimento algum, optou por uma forma de expressão bastante incomum: sua própria vida.

"Palavra escrita é lida com os olhos afoitos, impacientes; quase indiferentes, talvez". Sem papel nem caneta, resolveu fazer do gesto a sua palavra. 

"Opinião, opinião... opinião tem por toda a parte; parece que ninguém precisa de mais opinião". Resolveu fazer das atitudes os seus comentários

"Nunca entendi porque tanta pressa em propor, propor, propor. É tanto silêncio na hora em que se abrem as cortinas! Ninguém aparece para escrever a história com seus próprios atos... cá comigo, não quero mais propor nada. Quero apenas ser, ser aquilo que eu proporia. E de mim farei um laboratório, com as paredes de vidro. Serei real - se me encontrarem na rua, serei verdade, e não apenas o meu corpo agindo maquinalmente. E, sendo também presença, não estarei longe de penetrar outros universos além do meu. Farei parte das vivências de uma outra pessoa. Se no fim disso tudo eu ainda sentir que preciso me expressar, estarei apto a tal. Qualquer mensagem compreensível deve primeiro compreender aquele a quem é endereçada". Resolveu fazer da conduta o seu estilo literário, e da existência a sua própria obra.

R.

(Créditos das imagens:
http://2.bp.blogspot.com/_qFPctETAEEg/THPoRjMKEDI/AAAAAAAABD4/gdwTQ8mjTpc/s1600/untitled.bmp )

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

19/01/10                   O Gigante Gentil
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    Esse post é, antes de tudo, um agradecimento aos leitores desse Caderno. É um "obrigado" pelos comentários inteligentes, um "valeu gente!" pela atenção e pela companhia. A análise a seguir, da história contada pelo carvalho centenário, partiu de um comentário sobre o post anterior. Não pensem que é coisa de blog decadente, que faz "remix" de texto assim como emissoras decadentes fazem reprise de programa :)


Bem... tudo começa quando um velho carvalho do bosque resolve narrar um episódio que aconteceu ali. Era sobre um pequeno cão, jovem e idealista, que um dia passava pelo lugar e, no caminho, avistou um gigante vindo em sua direção. Tasso (o cão) pensou que sua vida terminaria naquele momento, pois julgou que um gigante monstruoso e rude como aquele iria engolí-lo ou esmagá-lo no instante em que o enxergasse.


A visão, criada no imaginário do pequeno cachorro, despertou nele um ódio pela injustiça e pela opressão do mais forte contra o mais fraco (quantas vezes não imaginamos toda uma discussão com alguém, por causa de algo que talvez a pessoa pudesse nos dizer?). Movido por isso, Tasso se recusa a fugir e começa a latir com toda a sua força e agressividade, enfrentando o Gigante, no que aparentemente constitui um ato de coragem.


Levando em conta o contexto, a "coragem" do cão se relativiza e acaba virando imprudência, até mesmo a verdadeira injustiça: o Gigante, que simplesmente passava pelo bosque, não obstante a sua aparência grotesca (algo que certamente não escolheu ao nascer), tinha bom caráter. De repente se vê sendo ofendido por um nanico que jamais tinha visto. Se o gigante quisesse revidar, o cão não teria chance, por mais valente que fosse (sendo realistas - sem milagres, ok?). E nem poderíamos dizer que o cão foi uma vítima... pois foi ele quem jogou a primeira pedra.


O que acontece, porém, é que o Gigante aceita a humilhação e segue adiante. Não por covardia - que risco um cão minúsculo pode oferecer? - mas por nele haver vitudes. Não sendo santo, sente até revolta, mas a humildade vence e ele segue seu caminho sem nada fazer de mal ao cão.


Minha intenção era desconstruir algumas idéias cristalizadas; quebrar pressupostos; contrariar a expectativa e criar um pouco de incômodo, o que sempre nos faz abrir a mente.


Quem escreve precisa estar atento, pois já conhece a história por todos os ângulos; o leitor, por sua vez, tem no texto a única fonte de informação sobre ela. Perdoem, caso tenham faltado peças na transmissão do conto! :)


(Créditos das imagens:
http://garatujando.blogs.sapo.pt/arquivo/Escultura%20gigante%20Homem.jpg )

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

27/11/09                 Uma Coragem Diferente


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    Muitas pessoas vêm a este bosque, buscando a paz e a sombra de um carvalho centenário para contar suas histórias. Desta vez sou eu, o velho carvalho, quem espera as pessoas sentarem-se à beira de minha paz para contar-lhes uma fábula deste bosque, presenciada por mim mesmo com muito encantamento, embora me faltassem os olhos.

    Foi num desses dias em que a chuva das nuvens escuras convive com os raios de sol de uma parcela ainda azul do céu. Avistei Tasso, um cão jovem e dono de muitas virtudes, que porém não havia crescido muito. O pequeno cachorro vinha de longe, caminhando em meio às árvores, buscando o córrego para beber um pouco de água. Quando esse cão apareceu no bosque pela primeira vez, procurou a mim para instruí-lo sobre o caminho das águas. Desde então, habituou-se a passar por aqui vez ou outra para me visitar e pedir por conselhos. Fico contente por ter sempre alguma palavra para ele. Algo qualquer de sabedoria que possuam os carvalhos certamente foi adquirido pelo longo tempo que passam no silêncio.

    E o que rompeu o silêncio daquela tarde foi uma coelhada que corria apressada. O estardalhaço dos coelhos foi seguido por ligeiros tremores no chão, dos quais ainda se lembram as minhas raízes. Pressenti ser um gigante que se aproximava, o que Tasso pôde confirmar ao ver a enorme silhueta vindo a passos rápidos. O pequeno cão sentiu um arrepio ao pensar que aquela poderia ser a sua última caminhada neste planeta. O Gigante avançava, com sua aparência monstruosa e seus gestos grosseiros, pisando arbustos e grunhindo sons. Minha intuição não me dizia coisas boas.

    Às vezes a falta de noção e a coragem se confundem. Tasso não procurou se esconder, embora grande fosse o seu medo, pois maior ainda que o temor era a sua revolta: por que os fracos precisam ser humilhados pelos fortes? Sentia um grande ódio pelas injustiças.  Não apenas a injustiça do Gigante contra o cão - aquilo que dizia respeito a ele próprio -, mas todas as formas de opressão que, imaginava ele, também deveriam existir muito além daquele bosque. Vencendo a hesitação, firmou as patas contra o solo e latiu.

    O pequeno olhava para os olhos imensos que ainda não o enxergavam e latia no limite de suas forças; fazia saltar as veias do pescoço num latido desajeitado, estridente, mas nimbado de idealismo. O Gigante, então, parou por um instante e baixou o olhar na direção de Tasso. Eu senti como se murchassem todas as minhas folhas; pensei estar prestes a presenciar o fim daquele cão tão amado. "Antes talvez nem passasse pela cabeça desse gigante lhe fazer mal", cogitei. Talvez o imenso homem nem sequer o notasse ali; agora, porém, o minúsculo cão o ofendera...

   E Tasso continuava a enfrentar o gigante. Quisera eu que o cãozinho se calasse e fosse embora dali, evitando uma desgraça. No entanto, o Gigante personificava toda a iniqüidade e os problemas do mundo para o jovem cão naquele momento. Combatia-o, portanto, com toda a agressividade do seu heroísmo atrevido, embora a insignificância do seu tamanho, como se de uma hora para outra pudesse adquirir poderes milagrosos e derrotá-lo.

   O Gigante admirou-se do insulto, proferido por um cãozinho que estava vendo pela primeira vez. Engoliu um pouco de saliva, esforçando-se para conter a indignação que sentia. Que fizera para merecer aquela agressão, de um desconhecido que poderia desaparecer com uma mera pisada sua? Olhou ainda uma vez para Tasso. Encheu os pulmões de ar para em seguida dar um supiro, e continuou sua caminhada, indiferente aos latidos.

   A garganta do cão foi perdendo a energia. Não sei o que se passou em sua cabeça naquele momento. Sei que, dali em diante, passei a amar também aquele gigante humilde que um dia andou por aqui.

Raul França

(Créditos das imagens:
http://www.fotodependente.com/postcard.img8883.htm?mode=search
http://cadacontoaumentaumponto.com.br/)

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

06/11/09            Me contaram um dia desses

    São Pedro, ambientalista que é, ficou sabendo pelo Twitter de uma nova campanha criada pela WWF e resolveu desligar a camada de ozônio essa semana para economizar energia.
   
    Aqui embaixo, torra-torra. Não, não é uma promoção das Casas Bahia (quem dera!), mas um calor danado mesmo.  Nos elevadores da cidade não se fala de outra coisa (literalmente).


domingo, 11 de outubro de 2009

11/10/09                Favor Ler com Espanto



    Não pretendo colocar aqui nenhuma informação de hoje em diante. Peço que não leia isto como lê um jornal: secamente, correndo as linhas com os olhos impacientes, olhos de tédio, ansioso por terminar de ler esta notícia para poder ler as outras, e ler mais e mais, freneticamente, como se as acumulasse. Como se somar números fosse sua ambição.

    Um caderno de realidades imaginárias, lido como um jornal, será decepcionante. Se você anda com pressa e sede de informações, melhor não ler. Porém, estando disposto a fazer passeios, aqui vai encontrar companhia. Eu também parei de escrever com pressa.

    Ao ler, permita-se envolver; deixe conduzir-se pelas palavras, caminhe com elas! Seja autor do significado que elas terão. É por isso que o blog recebeu este nome: um caderno de realidades imaginárias. Por mais que nós humanos queiramos ser realistas, o maior nível de realismo que podemos obter é o consenso entre as nossas imaginações.

    Ainda assim, consenso não significa, obrigatoriamente, verdade. Que ninguém na Terra termine o dia sem ter olhado com espanto ou surpresa para algum objeto, ou pessoa, ou lugar. Nosso espanto é música. Que ninguém na Terra termine o dia sem ter musicalizado a existência!
(A imagem acima foi encontrada na internet, sem referência ao autor)

domingo, 4 de outubro de 2009



    Alguma coisa parece ter mudado por aqui...